A ausência de notícias.
Por Joel Marc
Uma das maiores dores e dilemas que uma família sente ao ter um parente na UTI por complicações de Covid-19 é, sem dúvidas, a ausência de notícias. Como se não bastasse a impossibilidade de ver, estar perto e, por meio do abraço, consolar aquele que sofre, ainda temos que lidar, muitas vezes, com a ausência de informações precisas sobre o estado clínico daquele (a) que amamos.
No momento em que escrevo esta reflexão estou há, aproximadamente, 27 dias com minha avó Maria internada por complicações de Covid-19. Durante horas do dia vejo minha mãe ansiosa andando “de lá pra cá”, com o celular sempre por perto - pois qualquer ligação pode ser notícias do hospital - mas nem sempre é. Na verdade há dias em que esperamos e esperamos e nenhuma ligação vem, nenhuma atualização, nenhum diagnóstico do hospital… apenas o silêncio! Nessa hora o peito dói e percebemos que lidar com o desconhecido nos causa medo.
A ausência de notícias é, e sempre foi, um desafio à fé. No contexto panorâmico da bíblia há um exemplo claro disso: quando o povo de Israel, aguardando o cumprimento da promessa messiânica, teve que lidar com um período que ficou conhecido como “Período interbíblico”. Esse período representa o silêncio profético que permeia a transição do Antigo para o Novo Testamento, aproximadamente 400 anos de silêncio desde a última profecia de Malaquias até o início do Novo testamento, quando Deus não mandou notícias, não levantou nenhum profeta e tudo o que o povo poderia se apegar era com as lembranças de um passado em que, nitidamente, Deus intervinha em seu favor, ou nas promessas de que um dia “O Ungido” (משיח - Mashiah / Messias) viria ao resgate do seu povo, que enfrentava a humilhação de ser dominado por um Império atrás do outro. Certamente o povo hebreu passou esse longo período de tempo se perguntando: aonde está Deus?
Lembro-me de que algumas bíblias antigas - aquelas da capa preta que hoje já estão bem desgastadas pelo tempo - costumavam vir com uma representação simbólica desses 400 anos de silêncio de Deus: elas possuíam 4 páginas em branco que separavam o A.T do N.T, ou seja, ao chegar na última página de Malaquias - e sentir aquela expectativa messiânica do povo de Israel - o leitor precisaria passar uma, duas, três… quatro páginas para só então reencontrar-se com a tão aguardada voz de Deus, que quebra o silêncio e diz: Eu sempre estive por perto!
Atravessar algumas “páginas em branco” da vida exige fé em crer que, mesmo no Silêncio, Deus está agindo; que o Criador não necessita chamar atenção para si, mas muitas vezes Ele até prefere estar distante dos holofotes. Exige fé ter a consciência de que, na noite escura da alma, o Consolador não dorme e que o Emanuel é Deus, presente mesmo quando dEle nada podemos ouvir.
Dias nublados não são sinônimos de que a luz deixou de existir. Cremos em um Deus que continua a chorar com a gente, cremos que Deus se importa.
Depois de 400 anos de silêncio a notícia veio. Na improbabilidade, o Verbo novamente falou, desta vez a um senhorzinho sacerdote - seu nome: Zacarias - que pôde ouvir a notícia tão aguardada (desde os tempos do profeta Isaías): ele e sua esposa Isabel, já avançados em idade, seriam os pais daquele que foi anunciado há muuuuito tempo como “a voz que clama no deserto e prepara o caminho do Salvador” (Isaías: 40.03 / Lucas 1.76). Sim, o silêncio foi quebrado, o MESSIAS está vindo!
Talvez, assim como eu e minha família, no momento em que você está lendo esse texto, vem enfrentando a dor da ausência de notícias, a insegurança e a incerteza sobre o amanhã. Eu gostaria de lhe convidar à seguinte oração:
Deus concede-nos a paz que excede todo entendimento para aprendermos a descansar em suas promessas de esperança para um novo amanhã. Mesmo quando somos assolados pelo silêncio da ausência de notícias, concede-nos a sabedoria de fazer o que podemos fazer, e o que não está em nosso alcance, termos fé de que, certamente, está ao alcance do Deus Soberano e Criador. Confiamos que Tu és um Deus amoroso, que em amor usa médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, assistentes sociais… usa a humanidade - e a criação - para revelar o seu genuíno amor. Que no tempo determinado as notícias de paz e esperança venham sobre o nosso coração, que só encontra verdadeiro descanso em Ti. Amém.
Já já o telefone toca, já já a notícia vem… e com a graça de Deus ouviremos: Maria está bem! Maria vive!
Graduado em História pela Faculdade Sumaré e bacharel em Teologia pela FLAM (Faculdade Latino Americana). Possui Extensão Universitária em História Judáica pela PUC-SP. Após atuar durante cinco anos como livreiro e mergulhar no universo dos livros cristãos, ingressou em 2019 como professor na Escola Pública do Estado de São Paulo. Atualmente é professor das disciplinas de História e Filosofia no colégio cristão Kairós e produtor de conteúdos terceirizados para plataformas de banco de questões modelo Enade, na área de tecnologia.