Abrace seus inimigos, como Deus nos abraçou em Cristo

Por Joel Marc

Abrace seus inimigos, como Deus nos abraçou em Cristo

O abraço faz parte da vida humana desde o nascimento, pois quando ainda bebê, a criança é abraçada no colo protetor e acolhedor dos pais ou repousa sobre o seio da mãe - até então, este é o único mundo conhecido daquele que acaba de vir ao mundo.  É por meio desse abraço que a criança se sente segura e aquieta o choro, podendo respirar o ar da vida. O abraço, provavelmente, estará presente na primeira queda, quando alguém vem abraçar a criança que está aprendendo a caminhar; e também na despedida do idoso, que já não tem mais forças para caminhar por conta própria.

 O abraço é a conexão do coração. Lembro-me de ver uma obra em um museu denominada “Anatomia de um abraço”, de Luna Lu, na qual, por meio de um abraço, é perceptível o encontro de dois corações.

O problema é que a humanidade, há muito tempo, vem preferindo a exclusão ao abraço.


[ “Anatomia do abraço”. Luna Lu – Exposição no 5° Salão Nacional de Cerâmica]

A bíblia conta uma história de abraço (Lucas 15.11-32) que é, provavelmente, o mais conhecido da bíblia – o abraço no filho pródigo que retorna para o lar. Mas também é um abraço do Deus Pai amoroso em todos nós que, simbolicamente, também já estivemos dissolutos em nossas vidas distantes da casa do Pai.

Quando lemos que “o pai correndo o abraçou”, descobrimos que na lógica do Reino de Deus é o inocente que generosamente oferece abraço àquele que o feriu, e não o culpado que precisa implorar pelo acolhimento.

Abraçar quando nós é quem fomos feridos é um ato divino de quem entendeu que o abraço é a personificação da Cruz de Cristo, que conecta o coração de Deus com o coração da humanidade, onde agora eu, você e o outro somos irmãos – filhos do mesmo Pai!
Quem nunca, em um dia frio, desejou o acolhimento de um abraço?  É bonito pensar que na própria criação Deus deixou mecanismos de cura mútua, pois pesquisas indicam que a prática do Abraço gera inúmeros benefícios à saúde. Sim, o abraço cura !

Nessas olimpíadas extremamente disputadas de 2021 em Tóquio, o abraço do time de vôlei do Brasil ao marcar o ponto do set  foi bonito e contagiante de se ver; foi cheio de intensidade, de vibração e de superação. Mas você já viu a emoção de uma filha que, depois de tanto tempo sem ver o pai, tem a possibilidade de receber o abraço e ouvir as palavras que durante toda a vida  almejou ouvir da figura paterna: “Eu te amo”?

 O grande dilema é como abraçar aquele que nos feriu? Como amar o inimigo? Como perdoar o imperdoável? Por esses dias refletia com um amigo que um dos mais importantes passos da fé Cristã é amadurecer a ponto de não se tornar um religioso cego e fanático – o que eu costumo chamar de fariseu moderno – mas  o segundo estágio dessa maturidade para alcançar uma espiritualidade saudável é conseguir superar o desafio de olhar para os religiosos de nosso tempo como Jesus também olhou para Saulo: em amor.

Hoje em dia temos inúmeros cursos e pregações dizendo como não ser um religioso – e isso é bom – mas, em contrapartida, não somos ensinados a como tratar aqueles que vivem como religiosos. Geralmente não nos sentamos à mesa com estes e potencializamos ainda mais a distância e a inimizade, vivenciando um ódio reverso.

Em outras palavras, se o primeiro passo para uma maturidade cristã é não ser um religioso cego que mata em nome de Deus, o segundo passo é ainda mais difícil, pois diz respeito a amar, perdoar e tratar aqueles que continuam sendo fariseus modernos.
Afinal, se Jesus salvou o maior fariseu da época – Saulo -, nós também devemos olhar para essas pessoas com amor, mesmo hoje elas estando cegas em suas convicções e tradicionalismos.

É como se internamente, depois que descobrimos a diferença entre Espiritualidade e Religiosidade, vivêssemos o conflito de Ananias, que sendo chamado para orar por Saulo, questionou: “Mas Deus, o Senhor quer usar Saulo?  O Senhor quer usar um ‘religioso’?”. O difícil é perceber e reconhecer que Deus muitas vezes quer, porque o chamado dele sobre nossas vidas não diz respeito a quem somos , mas a quem Ele é. Há pessoas para quem Deus tem projetos e propósitos estabelecidos desde o ventre materno, e o fato dessa pessoa ser um religioso cego não significa que Deus não irá usá-lo no tempo oportuno. Por isso, nós que já abrimos nossos olhos para não termos a mesma postura do irmão mais velho da parábola do Filho pródigo, precisamos também ser humildes e amáveis com nossos irmãos na fé que ainda estão presos na teia do legalismo e do farisaísmo moderno. Pode ser que dentre eles ainda haja muitos “Saulos” a quem Deus quer e vai transformar em “Paulos” – discípulos da graça.

Que o Espírito Santo nos capacite em Cristo, para sermos conforme a imagem do Filho de Deus, que foi capaz de servir a mesa àquele que o haveria de trair; que foi capaz de lavar os pés daqueles que um dia o abandonariam na Cruz; que foi capaz de tocar e abraçar até mesmo um leproso.

É muito provável que você ainda não tenha tido de fato um contato com um leproso, mas você certamente já teve contato com pessoas moralmente leprosas, politicamente leprosas, religiosamente leprosas, leprosas de alma... 

Vai lá! Aproxima-se, abrace-o e permita que na Graça de Deus a cura aconteça.

s Permita que os muros de separação sejam derrubados, permita que mais Saulos se tornem Paulos nas mãos de um Deus que usa pessoas perfeitamente imperfeitas.

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  • Joel Marc

    Graduado em História pela Faculdade Sumaré e bacharel em Teologia pela FLAM (Faculdade Latino Americana). Possui Extensão Universitária em História Judáica pela PUC-SP. Após atuar durante cinco anos como livreiro e mergulhar no universo dos livros cristãos, ingressou em 2019 como professor na Escola Pública do Estado de São Paulo. Atualmente é professor das disciplinas de História e Filosofia no colégio cristão Kairós e produtor de conteúdos terceirizados para plataformas de banco de questões modelo Enade, na área de tecnologia.