O bem comum
Por Marcelo Santos
Muito parecido com o conceito relacionado à justiça social, as discussões contemporâneas sobre o bem comum têm sido repletas de mal-entendidos, rejeições e polêmicas. A relação teórica do indivíduo com a comunidade representa um desafio no engajamento construtivo para a abordagem do bem comum. Outro desafio à relevância do bem comum vem de certas perspectivas dentro do protestantismo, que identificam a ideia como sendo integrante de movimentos sociais e políticos.
O bem comum de Aristóteles é definido no contexto da realização humana, e é encontrado mais notavelmente em sua ética. Aqueles que deliberam sobre o bem comum gozam de bons relacionamentos, além de ensinar uns aos outros as virtudes necessárias para que o bem comum na comunidade seja estabelecido. O interesse de Aristóteles pelo bem comum está associado ao cumprimento de uma meta pessoal. Ele não está, consequentemente, interessado em definir separadamente uma teoria da sociedade ou cooperação ou os valores constituintes de tal ideal. O que interessa a Aristóteles é que as pessoas alcancem a realização da bondade por meio desta busca pela virtude.
Aristóteles argumenta que a existência de relacionamentos humanos não só faz parte da realização virtuosa, mas possui uma forte influência na conquista da virtude. Como nós somos visivelmente sociais, apresentamos uma dependência do outro nesse processo de construção e cuidado, não só cuidando de jovens, idosos e frágeis, mas também cuidando de objetos e recursos para motivar e impulsionar a generosidade e a munificência dos ricos e poderosos pelos vulneráveis.
O conceito de "bem comum" possui uma grande influência no significado e na conduta da sociedade humana, e se entrelaça na história dos ensinos cristãos. As pessoas fazem escolhas, expressamente, para atingir o bem comum, ou ele é buscado indiretamente quando as pessoas buscam uma meta celestial e o bem comum se manifesta.
A revelação e a experiência de reconciliação com Deus em Jesus Cristo levam as pessoas a formarem comunidades que procuram, demonstram e apoiam o bem comum. Porém, a combinação dos conceitos de competição entre indivíduos e a prioridade do Estado-nação na sociedade, desestimulam a prática do conceito de bem comum. Uma elaboração teológica do bem comum que surge a partir da pessoa e obra de Jesus Cristo revelada na história humana pode nos apoiar nessa compreensão.
A reconciliação por meio de Cristo demonstra e transforma a relação das pessoas a partir da generosidade, criatividade e amor. Os relacionamentos reconciliados com Deus e uns com os outros permitem comunidades que vão além da mera reciprocidade para um transbordamento de benefícios a outras pessoas. O Espírito chama, equipa e santifica essas comunidades para uma edificação virtuosa mútua no contexto de sua narrativa bíblica.
O bom relacionamento dessas comunidades cristãs se estende em uma interação benéfica por toda a sociedade. Essas comunidades reconhecem que seu conceito de bem comum se beneficia de seu envolvimento com a sabedoria de comunidades diferentes, e que suas práticas para o bem comum são estendidas em suas experiências àqueles com relacionamentos mais prejudicados.
O bem comum como princípio fundamental está intimamente ligado à dignidade humana e conduz à solidariedade. O mundo hoje está cada vez mais interdependente, ou seja, todos nós dependemos de outros países para o nosso próprio bem-estar. Embora possamos viver em diferentes partes do mundo, somos todos parte de uma família humana e, portanto, buscamos um bem comum universal.
Isso significa que as nações também devem ajudar uns aos outros. Jesus ensinou a Regra de Ouro aos seus discípulos: “Faça aos outros tudo o que você gostaria que fizessem a você” (Mt 7,12).
Dessa lei é extraída a grande sabedoria do bem comum. Buscar o bem comum é buscar cumprir a ordem de Jesus de fazer aos outros o que gostaríamos que fizessem a nós mesmos.
Mestre em Educação pela Universidade Interamericana (2019). Especialista em Teologia e Missões pela Faculdade Latino-Americana (FLAM - 2023), pós-graduando em Terapia de Casais pela Faculdade Prisma e Bacharel em Teologia pelo Centro Batista de Educação, Serviço e Pesquisa (CEBESP - 2020). Possui Extensão Universitária em Igreja e Missão, Educação Cristã e Aconselhamento pela FLAM - Faculdade Latino Americana (2021). Colunista do Chão da Vida e professor universitário na área de tecnologia e teologia em diversas universidades.