Névoa de nadas

Por Marcelo Santos

Névoa de nadas

“Névoa de nadas disse O-que-Sabe
névoa de nadas tudo névoa-nada”

CAMPOS, Haroldo de. Metalinguagem. São Paulo: Cultrix, 1976

Todos sabemos que os indivíduos vulneráveis não recebem muita consideração pelos políticos e burocratas da classe dominante, estes que deveriam zelar pelo bem-estar de todos os cidadãos e cidadãs.

Quando se trata da atual pandemia de coronavírus, a autora italiana Francesca Melandri escreve: “A classe social fará toda a diferença. Ficar trancado em uma casa com um lindo jardim não é a mesma coisa que morar em um conjunto habitacional superlotado. Nem poder trabalhar de casa ou ver seu emprego desaparecer”.

Nesse contexto, a classe trabalhadora que consegue sobreviver ao vírus que se alastra com uma grande velocidade, enfrenta o horror de não ser capaze de fornecer comida e abrigo para suas famílias. E nesta mistura tóxica de circunstâncias, somos liderados por um presidente que afirmou que o vírus se tratava apenas de uma “gripezinha”. O nacionalismo cristão no governo Bolsonaro é um vírus religioso que não dá trégua ao seu hospedeiro - o bem-estar comum e sua busca duradoura por prosperidade espiritual e material.

Diante de todo esse cenário caótico, podemos afirmar que as ações observadas por muitos políticos e líderes religiosos são “névoa e nadas”.

Em contrapartida, temos diversos exemplos positivos. Por exemplo, o Vaticano mudou suas liturgias para a modalidade online e forneceu diretrizes de novas orações para lidar com a pandemia. Em Bangladesh, as religiões responderam à crise de saúde oferecendo alívio espiritual e material.

No Brasil, algumas comunidades  tem recorrido a serviços virtuais para transmitir mensagens religiosas aos seus adeptos.

A esta altura, sabemos que a propagação do vírus segue o padrão de movimentação de pessoas, bens e serviços. A religião tem um papel aqui de persuadir as pessoas a prevenirem a perda de dezenas de milhares de vidas de forma realista, pois os esforços não devem se limitar às orações, apenas.

Como a vacina ainda está longe de ser disponibilizada a toda a população brasileira, é fundamental exigir que os líderes religiosos usem a linguagem da religião para alertar as pessoas sobre os riscos que enfrentam durante esta pandemia global devastadora.

Ciência e fé não podem ser separadas em meio a esta pandemia.

Esta crise deveria ser o momento para as religiões, bem como os líderes religiosos, se envolverem na explicação e no apoio a descobertas científicas racionais para salvar vidas humanas.

 


  • Marcelo Santos

    Mestre em Educação pela Universidade Interamericana (2019). Especialista em Teologia e Missões pela Faculdade Latino-Americana (FLAM - 2023), pós-graduando em Terapia de Casais pela Faculdade Prisma e Bacharel em Teologia pelo Centro Batista de Educação, Serviço e Pesquisa (CEBESP - 2020). Possui Extensão Universitária em Igreja e Missão, Educação Cristã e Aconselhamento pela FLAM - Faculdade Latino Americana (2021). Colunista do Chão da Vida e professor universitário na área de tecnologia e teologia em diversas universidades.